sexta-feira, 18 de setembro de 2009

O seu sérgio - da bergamota

Seu Sérgio e dona Matilde voltavam da mateada e encontro familiar do centro da cidade de Ponto Verde. A cidade era habitada por pouco mais de 15 mil pessoas, não existia nenhum prédio. No centro, uma praça, uma Igreja e, mais além, um Parque. Neste Parque haviam muitas árvores e plantas, flores e frutas. Ninguém tomava refrigerante ou cerveja: as laranjas do parque nunca permitiram. Tudo foi de graça. Eis que Seu Sérgio encontra um grande amigo seu, quase vizinho, morador do outro lado da cidade:

-Úte Sérgio, mé que temo?
-De sempre. E como vai tu e a Família Cardoso?
-Maravilha. Agora o que eu ando brabo é com essa política, todo mundo nos roubando Sérgio. As pessoa não sabe votá! Ninguém se manifesta, enquanto isso os político roba nosso dinheiro. To achando que a gente tá ficando pior que cachorro, temo virando animal!

Enquanto isto Seu Sérgio colhia uma bergamota em uma árvore do Parque. Descascou a bergamota enquanto o Sr Cardoso falava quase sem parar, exceto as pausas para escarro. Exalou o cheiro de bergamota pelo ar, Seu Sérgio comeu uns três gomos da fruta, e com a boca ainda suja, terminou o assunto:
-Mas que bom! virar animal? parece que estamos aonde deveríamos estar. O burro, o macaco, o cachorro, e a bergamoteira, todos eles não precisam de mais nada, já sabem tudo.
-Mas como assim tchê! Que pode saber um cachorro? - replica o Sr Cardoso.
-Respirar.

Dá a volta e segue caminhando com dona Matilde, enquanto esta olha para um pedaço qualquer do espaço, com olhar de quem já sabe tudo que precisa. Ela diz o que vai fazer de janta, enquanto Seu Sérgio pensa em comer e dormir.

terça-feira, 15 de setembro de 2009

Os cheiros de ontem

A rua, a casa, o repolho podre, o sabonete
as flores dos canteiros, os bueiros
Nenhum deles tem cheiros.

Um dia claro, uma mudança de temperatura
uma lembrança, um dia de domingo
E os ontens reaparecem com prestígio.

Aquele dia sem cheiro, foi vivido, refletido
amassado e derretido
E em um dia de sol, toda vista e toda luz
que eu havia escondido

Agora reaparece. A luz do sol depois da chuva
e o cheiro do passado volta dizendo algo
um sabor de significado, do que antes não se sabia o que é

Num dia comum, as coisas não se percebem
as coisas não tem cheiro

Mas eis que de repente, aparece dentro de mim
O cheiro de ontem, o cheiro do passado
o cheiro de todo tempo ao mesmo tempo
de todos os dias em um só dia

Transporte perceptivo, vivido, do que na hora já havia sido esquecido.
Na passividade, no humor rancoroso, num dia sem vento
Na calçada molhada, e nada na volta, e tudo de dentro
O passado trazendo pra hoje o cheiro do tempo.